28 de fevereiro de 2009

Artigo: Respeito é bom, a dona da vida gosta e merece

ÁGUA
(Foto: Rio Capivari, Veja SP)

Respeito é bom, a dona da vida gosta e merece
Por Edmilson Silva*

Ao poetizar uma das vertentes teóricas sobre o surgimento da vida, Gilberto Gil nos conduzir a celebrar que a água é a dona da vida. Nada mais certo do que esta verdade. Nós aprendemos bem cedo nos bancos escolares que 70% da superfície do planeta Terra é composto por água, o que nos leva a intuir o quão é precioso esse elemento, que nos mata a sede, é indispensável à higiene, e não pode faltar no preparo dos alimentos e dos medicamentos.

Poucos são os processos industriais que não utilizam a água, mas a água está cada vez mais sendo mal usada, quando não desperdiçada. Para ficar apenas em um exemplo, basta ver a quantidade de porteiros e donas de casa que, toda manhã, chova ou faça sol, ficam quase horas a “varrer” as calçadas com o chamado líquido precioso. Em frente ao Shopping Tijuca, no Rio de Janeiro, por volta das 6h, o zeloso dono de um quiosque que vende cachorros-quente noite e madrugada, limpa os arredores do estabelecimento dele com água. Todo santo dia. A conta que ele paga à concessionária deve ser bem alta.

Não há como não contrapor esse desperdício com a ameaça de que o Mar Ártico vai secar, fruto de estudos científicos, assim como pensar no quão desigual é a distribuição da água aos moradores da Terra, principalmente a maioria dos seus habitantes, os que ocupam as periferias das grandes cidades ou as regiões áridas do planeta. Obrigados a acumular a pouca água que conseguem, e expostas à falta de qualidade disponível, muitas dessas pessoas acabam adoecendo e mesmo morrendo por conta das doenças de veiculação hídrica. Mas este, convenhamos, é um assunto que envolve falta de saneamento básico, problema crucial, principalmente nos países em desenvolvimento, e deve ser tratado separadamente, em outro artigo.

Antes de se concretizar a ameaça do Mar Ártico secar, podemos constatar o adoecimento e a morte de muitos rios, sufocados, assoreados, asfixiados que estão sendo pelos agrotóxicos utilizados em larga escala nas megas plantações, pelos resíduos industriais que são carreados até seus leitos e também pelos esgotos. Sem falar, é claro, no lixo comum, e mesmo o incomum - quem nunca viu sofás inteiros ou partes dele em um rio? - lançado contra os cursos d’água.

Fato é que a água está, simultaneamente, ficando escassa e perdendo qualidade, à medida que se consolida mais e mais na condição de commoditie cara. Quanto euros custa uma garrafa de Perrier? Ouve-se falar que grandes grupos econômicos são donos de pedaços extensos das regiões geladas da Terra, a fim de garantir água para comercialização, ao mesmo tempo em que fica-se sabendo do degelo dos pólos. Não há um dia sequer em que não se fale sobre o aquecimento global e suas conseqüências, e, infelizmente, em contrapartida, pouco se faz para evitá-lo.

E com a questão da água não é diferente. Está aí, do alto de seu século e dois anos de idade, Dona Cano (Claudionor Vianna Telles Veloso), a mãe de Caetano e Maria Bethânia, que não me deixa mentir. Dedicou-se, entre outras atribuições pela manutenção da cultura genuína do Recôncavo da Bahia, a lutar pela preservação do Subaé, mas quem for hoje a Santo Amaro da Purificação, cidade próxima a Salvador, verá a tristeza que é a morte de um antes vigoroso rio, em que era realizada festa com procissão para Nossa Senhora dos Navegantes e se podia fluir com saveiros.

Assim como o Subaé, muitos outros rios brasileiros estão ficando à míngua, produzindo as conseqüências nefastas associadas à falta de qualidade das águas, tudo por conta da inexistência de políticas públicas associadas à manutenção das bacias hidrográficas de um país em cujo subsolo está boa parte de um dos maiores aqüíferos do mundo. Ou será que por sabermos da existência do Aquífero Guarani, não estamos nem aí para preservar a qualidade e a quantidade da água que nos resta?

É lamentável constatar que a atuação, pelo menos a que ganha visibilidade, do Ministério do Meio Ambiente, seja priorizada pela questão do desmatamento da Amazônia, pouco se sabendo o que vem sendo e se está sendo feito algo em favor das nossas águas.

Águas que tem nos abastecido com energia elétrica, ajudado a alimentar as populações com os frutos da terra e da água doce também, águas que precisam ser respeitadas, preservadas, antes que, dentro de futuro breve, esse bem vital fique cada vez mais caro e se agudize, ainda mais, a questão de sua utilização. Muita e de boa qualidade apenas para os ricos. Respeitada a opção do mercado, a água é um bem natural e a todo cabe o respeito ao elemento que nos mantém vivos, afinal, assim como a Terra, 70% do planeta do nosso corpo também são constituídos, adivinha por quê?

* Edmilson Silva é jornalista, especializado em Ciências. É colunista da revista Plurale.

2 comentários:

Milton T disse...

A água será o ponto de discórdia no futuro, como o petróleo é hoje.

lembrei do Guilherme Arantes, deveria ter ganhado aquele festival
bjs

@infoambiental disse...

Só não podemos nos acostumar com a idéia e esperar acontecer! Beijo. RaquelAlmeida

Postar um comentário